Sem trela nem drama
- Lara
- 11 de fev. de 2021
- 3 min de leitura
Atualizado: 25 de fev. de 2021
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E vem com banda sonora!!

Há quase um ano que resolvi começar a levar a Farrusca para correr comigo, o que não foi fácil!
Eu gosto de fazer exercício de manhã, como quem lava os dentes, e ela não. Nem de lavar os dentes nem de fazer exercício! Se possível, gosto de ir bem cedo. Gosto de sentir o frio quer da manhã quer da madrugada, o dia a acordar comigo, ver as coisas e a vida a acontecer e a mudar: umas a irem, outras a virem.
Chamava a Farrusca e ela demorava mesmo muito a vir! Aparecia quando queria mas vinha a acordar e toda quentinha. Com uma cara de:
- O que foi?
- Vais dar-me mimo?
- Vou dormir para ao pé de ti?Bora!!?»
Sentia alguma frustração porque queria sair o mais rápido possível, mas também queria tanto que ela viesse e imaginava o quanto podia ser bom. Acabava sempre por me distrair com o seu jeito tranquilo e aquela barriga fofa, rija e quente.
Com a Farrusca puxada a ferros, ou melhor puxada ao colo, lá descíamos o quarto andar.

Já lá em baixo lançava-me o olhar de:
«O que é que estamos aqui a fazer a estas horas e com este frio? E mais, não me metas nisto! Se queres vir, vem sozinha. Olha!»
Tudo com o ar mais fofo deste mundo, e do outro!
E lá vou eu:
Ignorar o olhar, de quem quer voltar para a cama ✅
Ignorar o corpo pequeno, fofo e rijo de quem não vai andar (Por este andar só corro à 13h00 da tarde, mas vamos fingir que não se passa nada..) ✅
Olhar em frente (Se não te mostras confiante ela não anda Lara!) ✅
Isto tudo numa fração de segundos.

Avanço com firmeza, mas mal consigo dar um passo, porque percebo que tenho de levar a mademoiselle ao colo, pelo menos até ao final da rua. Ou é no colo ou é a rojo! Fui descobrindo que não interessa o quão arrasadas cheguemos ao fim da rua, o que interessa é que no fim da rua ela anda, ela FINALMENTE ANDA(!!) e no fim da rua só temos mais 10 minutos pela frente!
Até chegar ao jardim a que gosto de ir ainda são uns 15 minutos. Temos um mais perto, mas está sempre cheio de carros e confusão. Isso temos em comum, ela também prefere lugares mais sossegados. No jardim fica logo com uma energia mais aberta. Mas mesmo correndo devagar, mesmo que estivesse solta, não a sentia muito feliz. Interpretei que não lhe fazia sentido e que ela tinha razão: se eu queria correr deveria continuar a fazê-lo sozinha. Mesmo assim não conseguia ignorar o quanto ela ficava diferente naquele lugar, assim como eu também ficava. Às vezes ela até corria, ficava bem divertida, mas só o tempo que lhe apetecia!
Sempre tive dificuldade em fazer caminhada como atividade física mas a Farrusca sugeriu-me não só isso, como também que passássemos mais vezes. Mostrou-me que ela gosta de ouvir os barulhos do campo, de cheirar e comer tudo o que é verde, fazer cocó escondida nas ervas, caminhar devagar mas com entusiasmo! De repente olhar para mim, com um ar malandro, começar a correr, depois parar e voltar a andar.
Caminhamos lado a lado ou ela fica mais para trás e eu fico mais para a frente, fazemos músicas e cantarolamos. Temos tempo para tudo, vemos as coisas e vemos a vida. Quando chegamos o pelo dela até parece que brilha mais, e olha que o meu também!
Agora quando a acordo ela já vem mais rapidamente, mal chegamos à porta do prédio faz logo a curva em direção ao jardim, sem trela nem drama! Pergunto-me, se fosse correr, como é que ia ter tempo de ver a Farrusca a raspar o rabinho pelo chão e a cara das pessoas a olhar para ela e para mim? Eu adoro! Uns passam de skate, eu passo com a Farrusca. Lá vai com o seu corpo encolhido, a deslizar o rabinho pela ciclovia, naquele jardim enorme cheio de azedas, oliveiras, pássaros e coisas que ainda não apareceram ou ainda não descobrimos.
Bora dar outro passeio, Farrusca?
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